sexta-feira, 21 de outubro de 2016

João Cabral de Melo Neto (1920 Recife – 1999-) - GERAÇÃO DE 1945



João Cabral de Melo Neto (1920 Recife – 1999-) -3º E.M.     -GERAÇÃO DE 1945.
Academia Brasileira de Letras;  Poeta engenheiro- preocupação  quase geométrica com a forma.
Passou a infância em engenhos de açúcar em São Lourenço da Mata e Moreno
Catar Feijão
Catar feijão se limita com escrever:
Jogam-se os grãos na água do alguidar
E as palavras na da folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo;
pois catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

Ora, nesse catar feijão entra um, risco
o de que entre os grão pesados entre
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,

açula a atenção, isca-a com risco.
João Cabral de Melo Neto
Podemos perceber que ele utiliza um simples ato do cotidiano, que é o de catar feijão, e compara-o com a prática da escrita, ou seja, assim como os grãos devem ser minuciosamente escolhidos, as palavras devem ser muito bem articuladas para que haja clareza, no que se refere ao exercício da linguagem.

A afirmativa torna-se verídica ao analisarmos os seguintes versos:

“Joga-se os grãos na água do alguidar
E as palavras na folha de papel
E depois, joga-se fora o que boiar.”

Dando prioridade à análise da poesia  percebemos que o artista parece não dialogar com um leitor comum, mas com os outros poetas. Podemos chamar isto de “Métrica do Intelecto”, no qual o “fazer poético” tem o seu sublime destaque.

Características:

Sua obra apresenta duas linhas-mestras:

1-a metapoética (=Poema em que o autor fala sobre o próprio poema, a poesia e/ou seu processo de criação) A linha metapoética abrange os poemas de investigação do próprio fazer poético. POEMA- TECENDO A MANHÃ.

 2- a participante(. = revela nítidos traços relacionados a questões sociais, tendo como “pano de fundo” o cenário nordestino. Contudo, tal habilidade é tamanha que o nobre poeta transforma essas questões (tais como a fome, miséria, a aridez do sertão) em elementos essencialmente poéticos, capturando-se em toda a sua essência, assim como fez em Morte e Vida Severina)

É o poeta da pesquisa formal, da exatidão, da linguagem enxuta.
MORTE E VIDA SEVERINA( participante é aquela que tem como tema o Nordeste, com todos os problemas voltados para a questão social, tais como a miséria, a indigência, a fome, entre outros.)
 Poesia de rigor formal;
Todo seu trabalho está marcado pela preocupação formal;
temas nacionais;
Sua linguagem se entrega à sintaxe precisa, salpicada da vivência nordestina.
rigor técnico e o ritmo impecável de seus versos,
Sua poética é autoexplicativa e sua principal temática é a reflexão do fazer poético em que a linguagem aparece reduzida ao essencial. Morte e Vida Severina, "auto de Natal pernambucano", é, segundo Alfredo Bosi, "o seu poema longo mais equilibrado entre rigor formal e temática participante".

-poesia introspectiva, baseada na reflexão;
antissentimentalismo (rejeita emoções, ruptura com o lirismo)


PRINCIPAIS OBRAS

Poesia
1º livro- Pedra do Sono (1942)- presença do surrealismo.(irrealidade, sonho e sono.) Na literatura dita surrealista, as palavras deveriam ser escritas conforme viessem ao pensamento sem seguir nenhuma estrutura coerente. 
2º LIVRO-O Engenheiro (1945)-traz as bases de sua nova concepção de poesia;
Psicologia da Composição, Fábula de Angion e Antiode (1947); O Cão sem Plumas (1945); O Rio (1954); Duas Águas, Morte e Vida Severina, Paisagens com Figuras e Uma Faca só Lâmina (1956); Quaderna (1960); Dois Parlamentos (1961); Terceira Feira (1961); A Educação pela Pedra (1966); Poesias Completas (1940-1965), (1968); Museu de Tudo (1976); Escola das Facas (1981); Serial e Antes e A Educação Pela Pedra e Depois (1997).
Prosa
Considerações sobre o Poeta Dormindo (1950); Joan Miró (1950).

POEMA – “Morte e Vida Severina”,  um auto de Natal de temática regionalista escrito entre 1954 e 1955, é a obra-prima do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920 - 1999). O poeta, que nasceu no Recife, transformou em poesia visceral a condição do retirante nordestino, sua morte social e miséria.
A obra é, acima de tudo, uma ode ao pessimismo, aos dramas humanos e à indiscutível capacidade de adaptação dos retirantes nordestinos. O poema choca pelo realismo demonstrado na universalidade da condição miserável do retirante, desbancando a identidade pessoal.
Resumo
Personagens
Severino é o narrador e personagem principal, um retirante nordestino que foge para o litoral em busca de melhores condições de vida.
Seu José, mestre carpina, é o personagem que salva a vida de Severino, impedindo este de tomar sua própria vida.

Resumo
Na abertura da peça, o retirante Severino se apresenta à plateia e se dispõe a narrar sua trajetória. Sai do sertão nordestino em direção ao litoral, em busca da vida que escasseava em sua terra. Ao longo do caminho, mantém uma série de encontros com tipos nordestinos. Logo de saída encontra os irmãos das almas, lavradores encarregados de conduzir a um cemitério distante o corpo de um colega, assassinado a mando de latifundiários. Aos poucos, assiste à seca do rio Capiberibe, que Severino segue em sua viagem ao litoral. Passa por um lugarejo e ouve uma cantoria vinda de uma casa. Trata-se do canto de excelências, isto é, fúnebre, em honra a outro Severino morto. 
Com a morte definitiva do rio, Severino pensa em desistir de sua viagem, mas acaba por optar pelo prosseguimento. Assim, planeja instalar-se naquele mesmo lugar. Conversando com uma moradora, percebe que nenhuma das atividades que poderia desempenhar – agricultura e pecuária – encontraria espaço ali, mas apenas aquelas ligadas à morte, como rezadeira e coveiro.
Severino continua sua jornada e passa pela Zona da Mata, região de relativa prosperidade no interior do sertão. Encanta-se com a natureza verdejante do lugar, mas percebe ainda a presença da morte ao testemunhar o funeral de um lavrador que se realiza no cemitério local. Abandona o pensamento inicial de encerrar ali a busca que mantinha pela vida e continua sua viagem.
Por fim, chega ao Recife, onde resolve descansar ao pé de um muro. Trata-se de um cemitério, e Severino escuta então o diálogo entre dois coveiros. Os trabalhadores conversam sobre o trabalho que lhes dão os retirantes que saem de suas casas sertanejas para morrer ali, fazendo-o ademais no seco e não no rio – o que lhes daria menos serviço e mais sossego. Diante desse novo encontro com a morte, Severino resolve entregar-se a ela e se matar, atirando-se em um dos rios que cortam a cidade.
Ao se aproximar do rio, inicia um diálogo com José, mestre carpina (carpinteiro), morador ribeirinho. Pergunta-lhe se aquele ponto do rio era propício ao suicídio. O mestre responde positivamente, mas tenta convencer o retirante a não se atirar. Severino pede então que lhe dê uma única razão para não fazê-lo.
A resposta do mestre é interrompida pelo anúncio do nascimento de seu filho. José o celebra com vizinhos e conhecidos, recebe os presentes pobres que lhe trazem, ouve as previsões pessimistas de duas ciganas a respeito do futuro da criança e, por fim, recordando-se da pergunta de Severino, dispõe-se a respondê-la. Afirma então que ele, José, não tem a resposta para a questão de saber se a vida vale ou não a pena, mas que o nascimento de seu filho funciona como resposta, representando a reafirmação da vida diante da morte.
Análise
João Cabral classificou sua peça de auto de natal pernambucano, levando em conta tanto a forma popular dos versos curtos, comuns nos autos medievais, quanto a circunstância de tratar de um nascimento (natal) e de ambientar-se no sertão pernambucano. O título promove uma proposital inversão entre vida e morte, colocando esta em primeiro lugar. Essa troca da ordem natural indica os encontros com a morte e a vitória da vida, no final. 
Lembrete
 Morte e Vida Severina  é uma peça de teatro em versos. O autor resgata uma forma popular – os versos curtos – para tratar de um assunto que atingia particularmente o povo nordestino: a seca.
Além disso, o nome próprio Severina é usado como adjetivo no título, sugerindo uma ampliação de sentido que é confirmada logo nas primeiras palavras do retirante, que, ao tentar se apresentar, evidencia que sua situação particular é, na verdade, uma metonímia do que ocorre com outros sertanejos, igualmente vítimas da seca.
Em seu caminho em direção ao litoral, Severino alterna diálogos e monólogos. Os primeiros representam os encontros sucessivos com figuras simbólicas da morte – irmãos de almas, carpideiras, rezadeiras, funeral –, inseridas no fundo social da peça, que é a disputa pela terra. Já os monólogos mostram as reflexões do retirante, que tenta redefinir seus rumos depois de cada diálogo.
Os pontos culminantes da trajetória fatalista do retirante são a morte do rio cujo percurso ele acompanha até o litoral – representação de um meio que se rende à morte como o morador instalado nele – e o paradoxo do contato com ofícios que demonstram vitalidade justamente porque associados à morte – rezadeira, coveiro, farmacêutico etc.
A chegada à cidade é a desilusão final do retirante. O diálogo travado entre os coveiros funciona como sua sentença de rendição à morte, ato máximo de seu desespero. Por outro lado, o nascimento de uma criança instala a contradição entre a opção de saltar fora da vida, desistindo dela e a alternativa de agarrar-se à existência e resistir à morte opressora. Nesse sentido, a simbologia da criança – para além de figurar o nascimento de Cristo, em sua condição de filho de carpinteiro – abarca a ideia da purificação, da limpeza de toda a podridão associada à morte. 
A peça não resolve a contradição, já que sua última fala é a do carpina propondo a vida a Severino, sem que se saiba a opção feita por este. No entanto, o título da peça, que propõe o encontro final com a vida, parece sugerir a vitória da resistência e da insistência na esperança.



Nenhum comentário:

Postar um comentário